“A cada geração o seu destino e as suas dores. Devemos armar os
nossos filhos para a luta heróica e difícil que os espera e eles
vencerão”.
(CÉLESTIN FREINET)RESUMO
Na literatura encontram-se várias referências quanto à importância do
meio familiar no processo de aprendizagem da criança. Segundo Marturano
(1998), a influência do ambiente familiar no aprendizado escolar é
amplamente reconhecida. Porém, não se deve atribuir a ela toda a carga
de responsabilidade pelo desempenho escolar do aluno. As
características da criança e a escola também influem. Sendo assim, este
trabalho construiu-se através de pesquisas bibliográficas e apresentou
como objetivo geral refletir e pesquisar a necessidade e a importância
da relação escola-família, tendo as intervenções do psicopedagogo como
elo, na busca de propiciar uma aprendizagem significativa na educação
do aluno. Este estudo teve uma abordagem qualitativa que, segundo
Chizzotti (1991, p.79), “parte do fundamento de que há uma relação
dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva
entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo
objetivo e a subjetividade do sujeito”.
1 INTRODUÇÃO
O Dia Nacional da Família na Escola foi criado em 2001, pelo Ministério
da Educação para conscientizar pais, educadores e toda a sociedade
sobre a importância da união entre a escola e a família na formação dos
alunos. Inúmeros exemplos vivenciados mostram que a escola melhora
quando a família está presente. Se a família se interessa pela escola, a
criança se interessa mais pelos estudos. E melhora o relacionamento da
família com a criança e vice-versa.
A família desempenha um papel importante na formação do indivíduo, pois
permite e possibilita a constituição de sua essencialidade. É nela que
o homem concebe suas raízes e torna-se um ser capaz de elaboração
alargador de competências próprias. A família é, portanto, a primeira
instituição social formadora da criança. Dela depende em grande parte a
personalidade do adulto que a criança virá a ser.
Se é na família que se constituem as alegrias, os desejos do homem, é
na escola que o indivíduo deve encontrar alicerce para sua formação
elaborada. Porém, as coisas não acontecem como deveriam em contexto
escolar. A escola tem sido um local de transmissão do saber e não de
desenvolvimento de competências integrais do aluno, competências essas
essenciais na inserção social. Entende-se que deva ser papel do
educador o desenvolvimento do ser humano numa desmistificação de que
somente o conhecimento pronto e acabado é que vale. O desenvolvimento e
o uso ativo de um contexto afetivo em sala de aula são fundamentais ao
educando. A escola deve ser um local de alegria e ampliação de
vontades e desejos, principalmente do desejo de aprender, pois na
escola a criança recebe formação cultural tornando-se membro da
sociedade.
A instituição escolar é local de desenvolvimento do saber e não de
retaliação do aluno e castração de anseios. Família e escola devem
aliar-se no objetivo de formar um aluno capaz e “bem resolvido”
afetivamente porque, é justamente neste fator, que estão as disposições
em aprender e conhecer mais e mais, construindo e firmando o
conhecimento em apoios realmente sólidos.
No contexto da educação, vem sendo discutida com maior ênfase, a
necessidade de uma participação efetiva das famílias na instituição
escolar. Tal preocupação pode ser visualizada tanto nas propostas
presentes na legislação educacional vigente, a exemplo da Lei de
Diretrizes e Bases (LDB), n. 9.394/96, como também em outras pesquisas e
publicações a exemplo do Jornal do MEC.
No que se refere à legislação, a Constituição Federal, em seu artigo 205, afirma que “a
educação é direito de todos e dever do Estado e da família”. No título
II, do artigo 1° da LDB, a redação é alterada para “a educação é dever
da família e do Estado”, mudando a ordem de propriedade em que o termo
família aparece antes do termo Estado. Se a família passa a ter uma
maior responsabilidade com a educação, é necessário que as instituições
família/escola mantenham uma relação que possibilite a realização de
uma educação de qualidade.
No desenvolvimento deste trabalho emergiram algumas questões de estudo
que nortearam toda a investigação, a saber: Em que medida o papel da
família, da escola e do psicopedagogo pode contribuir para que os
educandos superem suas dificuldades de aprendizagem escolares? Como
levar a família a participar da vida escolar do seu filho? Qual a
importância do psicopedagogo dentro das instituições de ensino?
A busca de conhecimento de como se relacionar com o aluno que possui
dificuldade de aprendizagem escolar é de extrema importância para as
famílias e educadores, pois objetivando uma melhor interação com o
referido aluno favorecerá seu desenvolvimento, superação ou minimização
das dificuldades de aprendizagem.
Esta monografia compreendeu em sua estrutura o Capítulo 1 com a
introdução onde estão inseridas as questões de estudo seguidas do
Capítulo 2 que abordou a visão afetiva entre escola e família. O
fenômeno pesquisado, dificuldade de aprendizagem, foi desenvolvido no
Capítulo 3. Finalizando o trabalho, a intervenção psicopedagógica no
contexto das dificuldades da aprendizagem foi apresentada no Capítulo
4.
2 A VISÃO AFETIVA ENTRE ESCOLA E FAMÍLIA
Desde os primeiros instantes de nascido o homem recebe a influência e a
afetividade da atmosfera familiar. Consequentemente, a vida afetiva de
uma pessoa tem uma longa trajetória pela educação nos convívios
familiar e social.
Sabe-se que a educação não formal constitui-se num dos pilares essenciais na construção do eu. O desenrolar desta implicará num desenvolvimento harmônico ou não do indivíduo. Segundo Kupfer (1989, p.46):
A educação da criança deve primar a dominação dos instintos, uma
vez que tem que inibir, proibir, reprimir. Sabe-se que a ausência de
restrições e de orientações pode deseducar em vez de promover uma
educação saudável. As angústias são inevitáveis, mas a repressão
excessiva dos impulsos pode originar distúrbios neuróticos. O problema,
portanto, é encontrar um equilíbrio entre proibições e permissão – eis
a questão fundamental da educação.
Percebe-se ser impossível o desenvolvimento do indivíduo fortuitamente.
A educação do contexto familiar influencia no desenvolvimento da
autoconfiança da criança, formando-a e constituindo-a, enquanto ser
humano completo. Os anseios, os desejos e as expectativas familiares
que envolvem a criança, promovem bem-estar e equilíbrio quando dosados e
colocados à disposição de maneira correta.
Todo educador sabe que o apoio da família é crucial no desempenho escolar. Segundo um estudo publicado no Journal of Family Psychology,
da Associação Americana de Psicologia, as crianças que freqüentam
festas e reuniões familiares têm mais saúde, melhor desempenho escolar e
maior estabilidade emocional. E mesmo o SAEB/99 (Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica), apontou que nas escolas que contam com a
parceria dos pais, onde há troca de informações com o diretor e os
professores, os alunos aprendem melhor.
Diversos educadores brasileiros também defendem que a família realize
um acompanhamento da escola, verificando se seus objetivos estão sendo
devidamente alcançados.
Essa atuação dos pais ainda é bem rara, de acordo com os resultados de
pesquisa realizada pelo Observatório do Universo Escolar. Essa
instituição ouviu mais de cem pais e educadores da rede pública e
privada de todo país e constatou que só 13% das escolas públicas mantêm
um relacionamento próximo com a família. Por outro lado, 43,7% dos
pais de alunos da rede pública acreditam que, se fossem promovidos mais
encontros e palestras interessantes, haveria maior integração com a
escola.
Por que pais e professores ainda não conseguem se entender? Segundo a
mesma pesquisa, a maior parte dos educadores atribui aos pais a origem
dos problemas de disciplina e apontam como fatores o novo modelo
familiar, no qual os adultos permanecem pouco tempo em casa, ou ainda
aquele que apresenta uma organização diferente da tradicional. Assim,
muitas crianças vão à escola para ser educadas e algumas, para ser
criadas. Ceccon, Oliveira e Oliveira (1999, p.87), assim falam a
respeito:
A consciência de que a fase decisiva é a que antecede a escola
obrigatória tem levado um número crescente de estudiosos a propor que a
criança seja atendida mais cedo, com única solução para compensar as
desvantagens que atingem as crianças mais pobres, dando-lhes melhores
chances de sucesso quando mais tarde entrarem na escola.
O cruzamento de dados do SAEB revela que a nota dos alunos é melhor
quando pais e professores se conhecem. Foi comprovado que a nota dos
alunos é mais alta quando os pais possuem maior escolaridade ou são
mais atuantes na vida acadêmica de seus filhos. Na quarta série, por
exemplo, a nota média de Português dos estudantes, cujos pais não
conhecem o professor e o diretor é de 165,24. Quando o pai participa da
vida escolar do filho, a nota sobe para 174,14. O mesmo acontece em
Matemática, 178,11 contra 184,80.
3 DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E SEU DIAGNÓSTICO
As dificuldades de aprendizagem, segundo Rogers (1988), podem
significar uma alteração no aprendizado específico da leitura e
escrita, ou alterações genéricas do processo de aprendizagem, onde
outros aspectos, além da leitura e escrita, podem estar comprometidos
(orgânico, motor, intelectual, social e emocional).
Conforme consta em Polity (1998, p.73), o termo Dificuldade de
Aprendizagem é definido pelo Instituto Nacional de Saúde Mental (EUA)
da seguinte forma:
Dificuldade de Aprendizagem é uma desordem que afeta as habilidades
pessoais do sujeito em interpretar o que é visto, ouvido ou relacionar
essas informações vindas de diferentes partes do cérebro. Essas
limitações podem aparecer de diferentes formas: dificuldades
específicas no falar, no escrever, coordenação motora, autocontrole, ou
atenção. Essas dificuldades abrangem os trabalhos escolares e podem
impedir o aprendizado da leitura, da escrita ou da matemática. Essas
manifestações podem ocorrer durante toda a vida do sujeito, afetando
várias facetas: trabalhos escolares, rotina diária, vida familiar,
amizades e diversões. Em algumas pessoas as manifestações dessas
desordens são aparentes. Em outras, aparece apenas um aspecto isolado
do problema, causando impacto em outras áreas da vida.
Segundo a autora, esse termo é definido de várias maneiras, por
diferentes autores, diferindo-se quanto à origem: orgânica,
intelectual/cognitiva e emocional (incluindo-se aí a familiar). O que
se observa na maioria dos casos é um entrelaçamento desses aspectos.
Para a compreensão das possíveis alterações no processo de aprendizagem
é necessário considerar-se tanto as condições internas do organismo
(aspecto anátomo-funcional e cognitivo), quanto as condições externas
(estímulos recebidos do meio-ambiente) ao indivíduo. Fatores como
linguagem, inteligência, dinâmica familiar, afetividade, motivação e
escolaridade, devem desenvolver-se de forma integrada para que o
processo se efetive (ROGERS, 1988).
Este trabalho refere-se ao papel da família no desenvolvimento da
aprendizagem da criança quanto ao aspecto psicológico, emocional,
social e de estimulação dos aspectos cognitivos.
Sabe-se que as crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem,
geralmente, possuem uma baixa auto-estima em função de seus fracassos e
que esses sentimentos podem estar vinculados aos comportamentos de
desinteresse por determinadas atividades, tempo de atenção diminuído,
falta de concentração e outros.
A família, desconhecendo as necessidades da criança e a maneira
apropriada de lidar com esses aspectos, muitas vezes, necessita de
orientações que lhe dê suporte e lhe possibilite ajudar seu filho.
Fatores como motivação, formas de comunicação, estresses existentes no
lar, influenciam o desempenho da criança no processo de aprendizagem, e
os psicopedagogos, muitas vezes, sentem-se limitados quanto às
orientações a serem dadas pela falta de conhecimento aprofundado sobre
os diversos aspectos familiares que podem contribuir para um resultado
mais desejável.
Vários comportamentos manifestados pelas mães também levam a questionar
a respeito da influência familiar sobre a aprendizagem. Segundo
Marturano (1999), há mães que demonstram excessiva ansiedade quanto a
superação da dificuldade da criança; outras que se mostram impacientes
quanto ao desempenho insatisfatório que o filho apresenta; mães que
atribuem todo o problema à criança e a caracterizam como “preguiçosa”,
“lerda”, “distraída”; mães que negam a dificuldade que a criança
demonstra; mães que não acompanham as atividades de seu filho e mães
que punem a criança pela seu fracasso nas atividades escolares.
Isso acontece pelo fato de os pais desconhecerem como ocorre a
aprendizagem e, portanto, necessitam de orientações específicas a esse
respeito. Sabe-se, também, que, muitas vezes, os conflitos familiares
estão associados a essas manifestações e que as relações familiares são
relevantes no desenvolvimento da criança, havendo, portanto, a
necessidade de maior compreensão desse processo, por parte dos
profissionais, para que possam intervir de forma mais abrangente diante
da problemática.
Em muitos casos, em um trabalho especializado com crianças apresentando
dificuldade de aprendizagem, não é suficiente transmitir aos pais as
atividades específicas a serem realizadas; outros aspectos ligados à
família, à escola ou relacionados a dificuldades em outras áreas do
desenvolvimento também estão presentes, e é necessário ouvir os pais,
analisar a situação e buscar caminhos que facilitem o desenvolvimento
global da criança.
Alguns pais confiam seus filhos com dificuldade de aprendizagem aos
professores acreditando que o mau desempenho da criança seja
proveniente apenas de si mesma, sem questionar sua possível
participação nessas alterações.
A importância da participação da família no processo de aprendizagem é
inegável e a necessidade de se esclarecer e instrumentalizar os pais
quanto as suas possibilidades em ajudar seus filhos com dificuldades de
aprendizagem é evidenciada ao manifestarem suas dúvidas, inseguranças e
falta de conhecimento em como fazê-lo. Conforme Martins (2001, p.28),
“essa problemática gera nos pais sentimentos de angústia e ansiedade
por se sentirem impossibilitados de lidar de maneira acertada com a
situação”.
Acredita-se que um programa de intervenção familiar seja de fundamental
importância para o desenvolvimento e aprendizagem da criança. O
relacionamento familiar, a disponibilidade e interesse dos pais na
orientação educacional de seus filhos, são aspectos indispensáveis de
ajuda à criança. Em um trabalho de orientação a pais, de acordo com
Polity (1998), é possível despertar a sensibilidade dos mesmos para a
importância destes aspectos, dando-lhes a oportunidade de falar sobre
seus sentimentos, expectativas, e esclarecendo-lhes quanto às
necessidades da criança e estratégias que facilitam o seu
desenvolvimento.
Através das experiências e relações interpessoais, a família pode
promover o desenvolvimento intelectual, emocional e social da criança.
Ela pode criar situações no dia-a-dia que estimularão esses aspectos,
desde que esteja desperta para isso. Além disso, a participação da
criança nas atividades rotineiras do lar e a formação de hábitos também
são importantes na aquisição dos requisitos básicos para a
aprendizagem, pois estimulam a organização interna e a habilidade para o
‘fazer’, de maneira geral (MARTURANO, 1998).
A família tem um papel central no desenvolvimento da criança, pois é
dentro dela que se realizam as aprendizagens básicas necessárias para o
desenvolvimento na sociedade, como a linguagem, sistema de valores,
controle da impulsividade. As características da criança também são
determinadas pelos grupos sociais que frequenta e pelas características
próprias, como temperamento.
As crianças possuem uma tendência natural, instintiva que as direciona
ao desenvolvimento de suas potencialidades. Os pais devem ter
conhecimento desse processo para que não dificultem ou impeçam o
crescimento espontâneo da criança. Pela falta de compreensão da
natureza e necessidades básicas do ser humano, os pais, muitas vezes,
prejudicam a busca do próprio desenvolvimento, pela criança. O modo
como os pais lidam com seus filhos pode ajudá-los no desenvolvimento
das suas potencialidades e no relacionamento com o mundo,
possibilitando-lhes o enriquecimento pessoal através das experiências
que o meio lhes proporciona.
O processo educativo (desenvolvimento gradativo da capacidade física,
intelectual e moral do ser humano) familiar deve ser adequado para
possibilitar à criança o sucesso na aprendizagem, proporcionando-lhe a
motivação, o interesse e a concentração necessária para a apreensão do
conhecimento.
A adequação desse processo compreende o atendimento às necessidades da
criança quanto à presença dos pais compartilhando suas experiências e
sentimentos, orientação firme quanto aos comportamentos adequados,
possibilidade de escolhas, certa autonomia nas suas ações, organização
da sua rotina, oportunidade constante de aprendizagem e respeito e
valorização como pessoa.
A criança necessita de equilíbrio entre condutas disciplinares e
diálogo, compreensão e carinho. Num processo educativo os pais
experienciam a necessidade de um trabalho de auto-análise, de
reestruturação de seus comportamentos, crenças, sentimentos e desejos.
Os pais precisam conquistar, em relação a si mesmos, primeiramente, o
que querem que os filhos sejam: justos, disciplinados, honestos,
responsáveis (GRUNSPUN, 1985). Esse processo ocorre nas vivências do
dia-a-dia, na medida em que pais e filhos comunicam-se de maneira
transparente e sincera, falando de suas percepções, suas dúvidas,
objetivos, emoções, aprendendo uns com os outros.
Criar filhos não significa torná-los perfeitos, pois os pais têm muitas
dúvidas e estão sujeitos a muitas falhas; mas o que é necessário é
tentar identificar os conflitos e desfazê-los, aprendendo a conviver
com essas situações. Através dos conflitos os pais desenvolvem a
percepção de si mesmos e de seus filhos. Essas situações estimulam pais
e filhos a instalar um diálogo verdadeiro, expondo o entendimento e
sentimento em relação às experiências cotidianas. Por outro lado,
aspectos fundamentais do processo educativo revelam que os pais devem
ter respeito sobre o que o filho sente, mas cabe a eles negar com
firmeza e determinação as atitudes que possam contrariar o que desejam
para a educação de seus filhos (TIBA, 1999).
Dificuldades escolares apresentadas pelas crianças, relacionadas à
falta de concentração e indisciplina ocorrem e podem ser causadas pela
ausência de limites. A primeira geração educou os filhos de maneira
patriarcal, isto é, os filhos eram obrigados a cumprir as determinações
que lhes eram impostas pelo pai. A geração seguinte contestou esse
sistema educacional e agiu de maneira oposta, através da
permissividade. Os jovens ficaram sem padrões de comportamentos e
limites, formando uma geração com mais liberdade do que
responsabilidade.
Tanto na família quanto na escola, segundo Tiba (1999, p.45), há “a
necessidade de orientação às crianças quanto às regras disciplinares,
para que elas possam desenvolver a capacidade de concentração e de
apreensão dos conceitos”. A aprendizagem se dá de maneira gradativa e
não será possível sem a participação ativa do aluno, de maneira
disciplinada, orientada.
Os pais devem preparar os filhos para arcarem com suas
responsabilidades. Na medida em que a criança vai aprendendo a cuidar
de si mesma, vai experimentando a sensação gratificante da capacidade
de enfrentar desafios. E cada realização é um aprendizado que servirá
de base para um novo aprendizado. Assim, realizando suas vontades e
necessidades, a criança vai gostando de si mesma, desenvolvendo a
auto-estima.
O relacionamento familiar também é fundamental no processo educativo. A
criança estará muito mais receptiva às instruções dos pais, se os
membros da família se respeitarem entre si, procurando conversar e
colaborar um com o outro. É importante a participação dos pais na vida
dos filhos, numa convivência como companheiros, compartilhando emoções,
o que contribui muito para a disciplina.
Todos esses aspectos citados e muitos outros, são fundamentais para que
o desenvolvimento da criança se efetive. Portanto, a família necessita
da ajuda dos profissionais na aquisição desses conhecimentos básicos e
essenciais para que possa cumprir seu papel de facilitadora do
processo de aprendizagem de seus filhos, através de comportamentos mais
adaptativos.
4 A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA NESTE CONTEXTO
A intervenção psicopedagógica veio introduzir uma contribuição mais
rica no enfoque pedagógico. O processo de aprendizagem da criança é
compreendido como um processo abrangente, implicando componentes de
vários eixos de estruturação: afetivos, cognitivos, motores, sociais,
políticos, etc. A causa do sucesso de aprendizagem, bem como de suas
dificuldades, deixa de ser localizada somente no aluno e no professor e
passa a ser vista como um processo maior com inúmeras variáveis que
precisam ser apreendidas com bastante cuidado pelo professor e
psicopedagogo.
Um outro problema grave a ser ressaltado é uma concepção redutora do
modelo piagetiano que tem sido adotada em boa parte dos cursos de
Pedagogia, no qual são privilegiadas apenas as colocações iniciais da
sua obra. Ela tem direcionado os professores a conceberem o processo de
ensino-aprendizagem de uma maneira estática, universalista e
atemporal. Com isto ficam de fora as contribuições mais importantes de
Piaget em relação aos processos de equilibração e reequilibração das
estruturas cognitivas (MARCELINO, 1998).
O educador já não se defronta com um processo linear de crescimento e
desenvolvimento, tanto no desenvolvimento intrínseco como na expressão,
mas com um realizar-se descontínuo no qual fases e períodos se
entrecruzam, se opõem dialeticamente, oposições de que resulta uma nova
estruturação. Paragens, acelerações, saltos bruscos são a expressão
formal. Isto altera completamente o panorama da pedagogia graduada: se o
desenvolvimento não é contínuo e ininterruptamente acelerado e
progressivo, como se lhe adequará uma educação regulada por grandes
períodos de desenvolvimento? Como pretender apreender a instabilidade do
desenvolvimento pela instabilidade de um processo educativo que se
mede por anos? Os fins da pedagogia não deveriam apontar para o homem
futuro, o que realmente será permanente e atuante, e não para as etapas
da idade evolutiva? (MARCELINO, 1998).
Esta visão aponta um deslocamento de uma vertente universalista atemporal para uma vertente particularista temporal.
Oliveira (1995) revela alguns dos aspectos fundamentais deste processo.
Segundo a autora, o fundamental “é perceber o aluno em toda a sua
singularidade, captá-lo em toda a sua especificidade em um programa
direcionado a atender as suas necessidades especiais”.
É a percepção desta singularidade que vai comandar o processo e não um
modelo universal de desenvolvimento. Isto porque o uso do modelo
universalista camufla normalmente uma concepção preestabelecida do
processo de desenvolvimento do sujeito. Na intervenção psicopedagógica
deve-se evitar as chamadas “profecias auto-realizadoras”, isto é,
prognósticos que o professor lança a respeito do processo de
desenvolvimento de seu aluno sem levar em consideração o seu
desempenho.
É preciso que o psicopedagogo também altere a sua forma de conceber o
processo de ensino-aprendizagem. Ele não é um processo linear e
contínuo que se encaminha numa única direção, mas, sim, multifacetado,
apresentando paradas, saltos, transformações bruscas, etc.
O processo de ensino-aprendizagem inclui também a não-aprendizagem, ou
seja, a não-aprendizagem não é uma exceção dentro do processo de
ensino-aprendizagem, mas se encontra estreitamente vinculada a ele. O
aluno pode se recusar a aprender em um determinado momento. O chamado
fracasso escolar não é um processo excepcional que ocorre no sentido
contrário ao processo de ensino-aprendizagem. Constitui, sim,
exatamente a outra face da mesma moeda, o seu lado inverso.
O saber e o não-saber estão estreitamente vinculados. O não-saber se
tece continuamente com o saber. Com isto, pretende-se dizer que o
processo de ensino-aprendizagem, do ponto de vista psicopedagógico,
apresenta sempre uma face dupla: de um lado, a aprendizagem, e do
outro, a não-aprendizagem.
O desejo de saber faz um par dialético com o desejo de não-saber. Segundo Fernández (1991, p.87):
O jogo do saber-não-saber, conhecer-desconhecer e suas diferentes
articulações, circulações e mobilidades, próprias de todo ser humano ou
seus particulares nós e travas presentes no sintoma, é o que nós
tratamos de decifrar no diagnóstico.
Neste contexto, a aprendizagem coloca em foco as diferentes dimensões
do aprendiz sob a ótica integradora dos aspectos cognitivo, afetivo,
orgânico e social. O “olhar” sobre estes aspectos, ao mesmo tempo que
relativiza a importância da escola na aprendizagem, coloca em foco a
importância de toda a reunião de fatores extra-classe que interferem no
processo de construção do conhecimento e do papel de aprendiz.
Ao considerar a aprendizagem como um processo articulado ao momento do
aprendiz, a sua história e as suas possibilidades sob o aspecto
cognitivo, afetivo e social, a Psicopedagogia, segundo Silva (1998,
p.59):
Rompe a ligação ensino-aprendizagem, porque, tanto o aprender como
processo quanto o processo de construção do conhecimento não têm
relação necessária com o ensinar e, finalmente, porque ambos os
processos antecedem e ultrapassam o ensinar.
Sob este ponto de vista passa a existir a necessidade de o
psicopedagogo investigar com profundidade os contextos do aprendiz e
tentar reuni-los em uma síntese que retrate o momento desse aprendiz,
ao mesmo tempo que viabiliza a aprendizagem.
Para aprender, o aluno precisa estar apto a fazer um investimento
pessoal no sentido de renovar-se com o conhecimento. Implica um
movimento que envolve, tanto a utilização dos recursos cognitivos
mesclados com os processos internos, quanto com suas possibilidades
sócio-afetivas. Vale dizer que a aprendizagem vai acontecendo à medida
que o educando vai construindo uma série de significados que são
resultados das interações que ele fez e continua fazendo em seu
contexto social.
Popularizou-se a visão de que não basta e nem é garantia de sucesso
escolar um ambiente doméstico favorável materialmente aos estudos, e
uma professora interessada e competente para que a aprendizagem
aconteça com sucesso. Desta forma, trabalha-se com a possibilidade do
modelo de aprendizagem não se caracterizar como algo de cunho somente
individual, mas também como um modelo desenvolvido em uma rede de
vínculos que se estabeleceu em família.
É a família que dará noções de poder, autoridade, hierarquia, funções
que têm diferentes níveis de poder e onde aprendem habilidades
diversas. Aprendem ainda a adaptar-se às diferentes circunstâncias, a
flexibilizar, a negociar. Enfim, desenvolverá o pertencimento da
criança ao seu núcleo familiar. À medida que a criança vive em família e
se submete aos seus rituais, processo e desenvolvimento, ela vai se
individualizando, diferenciando-se em seu sistema familiar. Quanto mais
as fronteiras entre os membros da família estiverem nítidas, mais
possibilidade de individualizar-se a criança terá. Se tiver irmãos, é a
oportunidade de experimentar relações com iguais.
É neste cenário que a criança constrói o seu modelo de aprendiz e a
forma como ela se relaciona com o conhecimento. Para a família do
aluno, a escola tem uma simbologia e um significado que estará presente
na forma de “ser aluno” e na sua forma de participação nas atividades
escolares. A maneira pela qual a criança se integra e se entrega ao seu
processo de aprender está diretamente relacionado à capacidade
desenvolvida em família de viver o coletivo compactuado.
Para a escola do aprendiz, a família é a matriz indispensável para que o
trabalho de construção do cidadão aconteça. Toda a riqueza do
desenvolvimento da criança se inicia na família e vai se fortificando à
medida em que esta vai estabelecendo sua rede relacional que, na
seqüência, acontece na escola e se expande para além dela. É em relação
com seus pares e em um contexto democrático que a criança consolida o
seu papel social de cidadã. Porém, de uma forma geral, a escola não vê
com bons olhos interferências pedagógicas suscitadas pela família que,
por sua vez, nem sempre aceita orientações psicopedagógicas de caráter
formativo da escola.
Nesse jogo de forças quem perde são os alunos e, conseqüentemente,
todos os envolvidos. O sucesso está na unidade e na coerência de
atitudes. Eis um desafio constante que, sem dúvida, merece ser
perseguido.
4.1 DIFICULDADES PARA A PSICOPEDAGOGIA
O trabalho psicopedagógico, mesmo no atendimento individual, encontra
dificuldades localizadas no desconhecimento do processo de aprendizagem
e na própria relação com o aprendiz.
Num trabalho na instituição escolar, o psicopedagogo, além dessas
dificuldades, encontra outros tipos de resistência, pois essa ação
exige mudanças no sentido de avaliar as propostas de ensino, a partir
do acompanhamento do processo de aprendizagem do aluno.
À tradicional aceitação do rendimento do estudante, sem análise do seu
processo de elaboração e das condições para sua aprendizagem, cria um
falso quadro sobre a situação de escolarização (MASINI, 1994).
Nesse enfoque, os maus resultados são vistos, quase exclusivamente,
como de responsabilidade do aprendiz. Apontá-lo como lento,
problemático, ou sem pré-requisitos é um procedimento comum por parte
das equipes educacionais, nas suas várias instâncias.
Analisar o processo do aluno em situação de sala de aula, na relação
com o professor e os colegas ante as condições de ensino que lhe são
oferecidas, constitui uma drástica mudança no quadro da escolarização,
exigindo dos educadores constante reflexão sobre sua ação. Isto não é
fácil, pois envolve transformações de atitudes e do pensar dos
educadores.
É preciso repensar o ato de aprender na instituição escolar utilizando
uma proposta viável em busca de uma aprendizagem significativa por
parte do sujeito.
5 CONCLUSÃO
Este trabalho possibilitou compreender que é de suma importância uma
relação cordial entre família e escola, ficando claro que ambas devem
caminhar juntas, pois torna-se necessário este entrosamento para que os
alunos tenham uma aprendizagem sequencial, na qual, os pais colaboram
diretamente com as propostas da escola. E a escola se propõe interagir
com a comunidade que a circunda, resultando, assim, num bom
desenvolvimento e crescimento para ambas.
De acordo com a literatura pesquisada, constatou-se também os efeitos
da rotulação e dos problemas de aprendizagem na escola, necessitando,
ainda mais a atuação do psicopedagogo dentro das instituições
escolares, trabalhando com diagnósticos, auxiliando os professores na
sala de aula e, principalmente, na prevenção dos casos de alunos com
problemas de aprendizagem, evitando mais um fracasso escolar.
Em síntese, uma escola é funcional quando conta com forte aliança entre
a comunidade, o corpo docente e o administrativo, os quais trabalham
os seus conflitos através da colaboração e diálogo. Esses elementos são
flexíveis em sua maneira de lidar com os conflitos, utilizando-se do
conhecimento de várias técnicas e métodos adequados. As decisões são
tomadas em conjunto e a participação dos alunos é solicitada, mas sem
ser igualitária. Cada membro do sistema escolar tem seu papel
determinado. O psicopedagogo observa e diagnostica o sistema escolar e,
então, cria condições favoráveis para a resolução dos problemas que
surgem, fazendo com que o ensinar e o aprender se tornem comprometidos.
Sendo assim, a atuação do psicopedagogo dentro da escola exige algumas
características básicas.
6 REFERÊNCIAS
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CECCON, Claudius; OLIVEIRA, Miguel Darcy de; OLIVEIRA, Rosiska Darcy de. A vida na escola e a escola da vida. 34 ed. Petrópolis: Vozes, 1999.
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MARTINS, Nanci de Almeida Rezende. Análise de um trabalho de orientação a famílias de crianças com queixa de dificuldade escolar. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas, 2001.
MARTURANO, E. M. Ambiente familiar e aprendizagem escolar. In: C. A. Funayama (Org.). Problemas de aprendizagem: enfoque multidisciplinar. Ribeirão Preto: Legis Summa, 1998.
MARTURANO, E. M. Recursos no ambiente familiar e dificuldades de aprendizagem na escola. In: Psicologia: teoria e pesquisa, v. 15, n.2, p. 135-142, mai.ago./1999.
MASINI, Elcie F. Salzano (Org.). Psicopedagogia na escola: buscando condições para a aprendizagem significativa. São Paulo: Loyola, 1994.
OLIVEIRA, Marta Kohl. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. 2.ed. São Paulo: Scipione, 1995.
POLITY, E. Pensando as dificuldades de aprendizagem à luz das relações familiares. In: POLITY, E. Psicopedagogia: um enfoque sistêmico. São Paulo: Empório do livro, 1998.
RACY, Andréa; VIEIRA, Patrícia. As dificuldades de aprendizagem na escola. Disponível em: . Acesso em 24/03/2006.
ROGERS, C. O tratamento clínico da criança-problema. São Paulo: Martins Fontes, 1978.
SILVA, Maria Cecília Almeida. Psicopedagogia: em busca de uma fundamentação teórica. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.
TIBA, Içami. Disciplina na medida certa. São Paulo: Gente, 1999.
7 ANEXO
ENTREVISTA REALIZADA POR ANDRÉA RACY E PATRÍCIA VIEIRA PARA O SITE: .
ENTREVISTA: AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA ESCOLA
ENTREVISTADA: NEIDE DE AQUINO NOFFS
Andréa e Patrícia – Quais os instrumentos que você utiliza para identificar os alunos com dificuldades de aprendizagem?
Neide: Os instrumentos que utilizo são: observações, situações
pedagógicas, situações projetivas, entrevistas com professores e com
famílias dos alunos, questionários, análise da produção do
aluno/professor/hora do jogo.
Andréa e Patrícia – Como a escola procede no sentido de fazer
o encaminhamento de um aluno para realizar um diagnóstico ou um
trabalho psicopedagógico?
Neide: O encaminhamento é feito somente após o professor
esgotar seus recursos didático-pedagógicos em sala de aula,
diferenciando problemas educativos, de sociais.
Andréa e Patrícia – Quais os cuidados que a escola deve tomar em relação ao aluno, à família e aos professores responsáveis pelo aluno?
Neide: Os cuidados em relação aos responsáveis pelo aluno,
seja família ou professor, é trabalhar no sentido de prevenir problemas
de aprendizagem escolar através de grupos de estudo, grupos de apoio à
família, projetos específicos envolvendo a formação de qualidade do
professor e o entrosamento da família e escola.
Andréa e Patrícia – Qual o papel da escola diante dos alunos com dificuldades de aprendizagem?
Neide: O papel da escola é o acolhimento à diversidade,
criando condições não só de acesso, mas, o de permanência dos alunos na
instituição escolar. Criar situações mobilizadoras onde novas
ferramentas sejam veiculadas, aproximar-se das famílias respeitando as
diferenças, rever o conceito de conteúdo, trabalhar na integração de
pessoas, metas e conceitos. O papel do psicopedagogo na escola deverá
ser o de um profissional que assessore a equipe e comunidade no sentido
de apoio psicopedagógico, buscando identificar e enfrentar as
dificuldades detectadas. O município de Ourinhos-SP já implantou este
profissional na rede pública com esta meta.
Andréa e Patrícia – Você poderia sugerir bibliografia sobre o assunto que possa auxiliar o trabalho do psicopedagogo?
NOFFS, Neide A. O psicopedagogo na rede de ensino. São Paulo: Elevação, 2003.
COLOMER, Camps. Ensinar a ler ensinar a compreender. Porto Alegre: Artmed, 2002.
POZO, Juan Ignácio. A solução de problemas, aprender a resolver, resolver para aprender. Porto Alegre: Artmed, 1998.
URIES, Zan; HILDEBRANDT et al. O currículo construtivista na Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2004.
SOLE, Isabel. Orientação educacional e intervenção psicopedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2001.
fonte: pedagogiaaopedaletra.com
“A cada geração o seu destino e as suas dores. Devemos armar os
nossos filhos para a luta heróica e difícil que os espera e eles
vencerão”.
(CÉLESTIN FREINET)RESUMO
Na literatura encontram-se várias referências quanto à importância do
meio familiar no processo de aprendizagem da criança. Segundo Marturano
(1998), a influência do ambiente familiar no aprendizado escolar é
amplamente reconhecida. Porém, não se deve atribuir a ela toda a carga
de responsabilidade pelo desempenho escolar do aluno. As
características da criança e a escola também influem. Sendo assim, este
trabalho construiu-se através de pesquisas bibliográficas e apresentou
como objetivo geral refletir e pesquisar a necessidade e a importância
da relação escola-família, tendo as intervenções do psicopedagogo como
elo, na busca de propiciar uma aprendizagem significativa na educação
do aluno. Este estudo teve uma abordagem qualitativa que, segundo
Chizzotti (1991, p.79), “parte do fundamento de que há uma relação
dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva
entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo
objetivo e a subjetividade do sujeito”.
1 INTRODUÇÃO
O Dia Nacional da Família na Escola foi criado em 2001, pelo Ministério
da Educação para conscientizar pais, educadores e toda a sociedade
sobre a importância da união entre a escola e a família na formação dos
alunos. Inúmeros exemplos vivenciados mostram que a escola melhora
quando a família está presente. Se a família se interessa pela escola, a
criança se interessa mais pelos estudos. E melhora o relacionamento da
família com a criança e vice-versa.
A família desempenha um papel importante na formação do indivíduo, pois
permite e possibilita a constituição de sua essencialidade. É nela que
o homem concebe suas raízes e torna-se um ser capaz de elaboração
alargador de competências próprias. A família é, portanto, a primeira
instituição social formadora da criança. Dela depende em grande parte a
personalidade do adulto que a criança virá a ser.
Se é na família que se constituem as alegrias, os desejos do homem, é
na escola que o indivíduo deve encontrar alicerce para sua formação
elaborada. Porém, as coisas não acontecem como deveriam em contexto
escolar. A escola tem sido um local de transmissão do saber e não de
desenvolvimento de competências integrais do aluno, competências essas
essenciais na inserção social. Entende-se que deva ser papel do
educador o desenvolvimento do ser humano numa desmistificação de que
somente o conhecimento pronto e acabado é que vale. O desenvolvimento e
o uso ativo de um contexto afetivo em sala de aula são fundamentais ao
educando. A escola deve ser um local de alegria e ampliação de
vontades e desejos, principalmente do desejo de aprender, pois na
escola a criança recebe formação cultural tornando-se membro da
sociedade.
A instituição escolar é local de desenvolvimento do saber e não de
retaliação do aluno e castração de anseios. Família e escola devem
aliar-se no objetivo de formar um aluno capaz e “bem resolvido”
afetivamente porque, é justamente neste fator, que estão as disposições
em aprender e conhecer mais e mais, construindo e firmando o
conhecimento em apoios realmente sólidos.
No contexto da educação, vem sendo discutida com maior ênfase, a
necessidade de uma participação efetiva das famílias na instituição
escolar. Tal preocupação pode ser visualizada tanto nas propostas
presentes na legislação educacional vigente, a exemplo da Lei de
Diretrizes e Bases (LDB), n. 9.394/96, como também em outras pesquisas e
publicações a exemplo do Jornal do MEC.
No que se refere à legislação, a Constituição Federal, em seu artigo 205, afirma que “a
educação é direito de todos e dever do Estado e da família”. No título
II, do artigo 1° da LDB, a redação é alterada para “a educação é dever
da família e do Estado”, mudando a ordem de propriedade em que o termo
família aparece antes do termo Estado. Se a família passa a ter uma
maior responsabilidade com a educação, é necessário que as instituições
família/escola mantenham uma relação que possibilite a realização de
uma educação de qualidade.
No desenvolvimento deste trabalho emergiram algumas questões de estudo
que nortearam toda a investigação, a saber: Em que medida o papel da
família, da escola e do psicopedagogo pode contribuir para que os
educandos superem suas dificuldades de aprendizagem escolares? Como
levar a família a participar da vida escolar do seu filho? Qual a
importância do psicopedagogo dentro das instituições de ensino?
A busca de conhecimento de como se relacionar com o aluno que possui
dificuldade de aprendizagem escolar é de extrema importância para as
famílias e educadores, pois objetivando uma melhor interação com o
referido aluno favorecerá seu desenvolvimento, superação ou minimização
das dificuldades de aprendizagem.
Esta monografia compreendeu em sua estrutura o Capítulo 1 com a
introdução onde estão inseridas as questões de estudo seguidas do
Capítulo 2 que abordou a visão afetiva entre escola e família. O
fenômeno pesquisado, dificuldade de aprendizagem, foi desenvolvido no
Capítulo 3. Finalizando o trabalho, a intervenção psicopedagógica no
contexto das dificuldades da aprendizagem foi apresentada no Capítulo
4.
2 A VISÃO AFETIVA ENTRE ESCOLA E FAMÍLIA
Desde os primeiros instantes de nascido o homem recebe a influência e a
afetividade da atmosfera familiar. Consequentemente, a vida afetiva de
uma pessoa tem uma longa trajetória pela educação nos convívios
familiar e social.
Sabe-se que a educação não formal constitui-se num dos pilares essenciais na construção do eu. O desenrolar desta implicará num desenvolvimento harmônico ou não do indivíduo. Segundo Kupfer (1989, p.46):
A educação da criança deve primar a dominação dos instintos, uma
vez que tem que inibir, proibir, reprimir. Sabe-se que a ausência de
restrições e de orientações pode deseducar em vez de promover uma
educação saudável. As angústias são inevitáveis, mas a repressão
excessiva dos impulsos pode originar distúrbios neuróticos. O problema,
portanto, é encontrar um equilíbrio entre proibições e permissão – eis
a questão fundamental da educação.
Percebe-se ser impossível o desenvolvimento do indivíduo fortuitamente.
A educação do contexto familiar influencia no desenvolvimento da
autoconfiança da criança, formando-a e constituindo-a, enquanto ser
humano completo. Os anseios, os desejos e as expectativas familiares
que envolvem a criança, promovem bem-estar e equilíbrio quando dosados e
colocados à disposição de maneira correta.
Todo educador sabe que o apoio da família é crucial no desempenho escolar. Segundo um estudo publicado no Journal of Family Psychology,
da Associação Americana de Psicologia, as crianças que freqüentam
festas e reuniões familiares têm mais saúde, melhor desempenho escolar e
maior estabilidade emocional. E mesmo o SAEB/99 (Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica), apontou que nas escolas que contam com a
parceria dos pais, onde há troca de informações com o diretor e os
professores, os alunos aprendem melhor.
Diversos educadores brasileiros também defendem que a família realize
um acompanhamento da escola, verificando se seus objetivos estão sendo
devidamente alcançados.
Essa atuação dos pais ainda é bem rara, de acordo com os resultados de
pesquisa realizada pelo Observatório do Universo Escolar. Essa
instituição ouviu mais de cem pais e educadores da rede pública e
privada de todo país e constatou que só 13% das escolas públicas mantêm
um relacionamento próximo com a família. Por outro lado, 43,7% dos
pais de alunos da rede pública acreditam que, se fossem promovidos mais
encontros e palestras interessantes, haveria maior integração com a
escola.
Por que pais e professores ainda não conseguem se entender? Segundo a
mesma pesquisa, a maior parte dos educadores atribui aos pais a origem
dos problemas de disciplina e apontam como fatores o novo modelo
familiar, no qual os adultos permanecem pouco tempo em casa, ou ainda
aquele que apresenta uma organização diferente da tradicional. Assim,
muitas crianças vão à escola para ser educadas e algumas, para ser
criadas. Ceccon, Oliveira e Oliveira (1999, p.87), assim falam a
respeito:
A consciência de que a fase decisiva é a que antecede a escola
obrigatória tem levado um número crescente de estudiosos a propor que a
criança seja atendida mais cedo, com única solução para compensar as
desvantagens que atingem as crianças mais pobres, dando-lhes melhores
chances de sucesso quando mais tarde entrarem na escola.
O cruzamento de dados do SAEB revela que a nota dos alunos é melhor
quando pais e professores se conhecem. Foi comprovado que a nota dos
alunos é mais alta quando os pais possuem maior escolaridade ou são
mais atuantes na vida acadêmica de seus filhos. Na quarta série, por
exemplo, a nota média de Português dos estudantes, cujos pais não
conhecem o professor e o diretor é de 165,24. Quando o pai participa da
vida escolar do filho, a nota sobe para 174,14. O mesmo acontece em
Matemática, 178,11 contra 184,80.
3 DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E SEU DIAGNÓSTICO
As dificuldades de aprendizagem, segundo Rogers (1988), podem
significar uma alteração no aprendizado específico da leitura e
escrita, ou alterações genéricas do processo de aprendizagem, onde
outros aspectos, além da leitura e escrita, podem estar comprometidos
(orgânico, motor, intelectual, social e emocional).
Conforme consta em Polity (1998, p.73), o termo Dificuldade de
Aprendizagem é definido pelo Instituto Nacional de Saúde Mental (EUA)
da seguinte forma:
Dificuldade de Aprendizagem é uma desordem que afeta as habilidades
pessoais do sujeito em interpretar o que é visto, ouvido ou relacionar
essas informações vindas de diferentes partes do cérebro. Essas
limitações podem aparecer de diferentes formas: dificuldades
específicas no falar, no escrever, coordenação motora, autocontrole, ou
atenção. Essas dificuldades abrangem os trabalhos escolares e podem
impedir o aprendizado da leitura, da escrita ou da matemática. Essas
manifestações podem ocorrer durante toda a vida do sujeito, afetando
várias facetas: trabalhos escolares, rotina diária, vida familiar,
amizades e diversões. Em algumas pessoas as manifestações dessas
desordens são aparentes. Em outras, aparece apenas um aspecto isolado
do problema, causando impacto em outras áreas da vida.
Segundo a autora, esse termo é definido de várias maneiras, por
diferentes autores, diferindo-se quanto à origem: orgânica,
intelectual/cognitiva e emocional (incluindo-se aí a familiar). O que
se observa na maioria dos casos é um entrelaçamento desses aspectos.
Para a compreensão das possíveis alterações no processo de aprendizagem
é necessário considerar-se tanto as condições internas do organismo
(aspecto anátomo-funcional e cognitivo), quanto as condições externas
(estímulos recebidos do meio-ambiente) ao indivíduo. Fatores como
linguagem, inteligência, dinâmica familiar, afetividade, motivação e
escolaridade, devem desenvolver-se de forma integrada para que o
processo se efetive (ROGERS, 1988).
Este trabalho refere-se ao papel da família no desenvolvimento da
aprendizagem da criança quanto ao aspecto psicológico, emocional,
social e de estimulação dos aspectos cognitivos.
Sabe-se que as crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem,
geralmente, possuem uma baixa auto-estima em função de seus fracassos e
que esses sentimentos podem estar vinculados aos comportamentos de
desinteresse por determinadas atividades, tempo de atenção diminuído,
falta de concentração e outros.
A família, desconhecendo as necessidades da criança e a maneira
apropriada de lidar com esses aspectos, muitas vezes, necessita de
orientações que lhe dê suporte e lhe possibilite ajudar seu filho.
Fatores como motivação, formas de comunicação, estresses existentes no
lar, influenciam o desempenho da criança no processo de aprendizagem, e
os psicopedagogos, muitas vezes, sentem-se limitados quanto às
orientações a serem dadas pela falta de conhecimento aprofundado sobre
os diversos aspectos familiares que podem contribuir para um resultado
mais desejável.
Vários comportamentos manifestados pelas mães também levam a questionar
a respeito da influência familiar sobre a aprendizagem. Segundo
Marturano (1999), há mães que demonstram excessiva ansiedade quanto a
superação da dificuldade da criança; outras que se mostram impacientes
quanto ao desempenho insatisfatório que o filho apresenta; mães que
atribuem todo o problema à criança e a caracterizam como “preguiçosa”,
“lerda”, “distraída”; mães que negam a dificuldade que a criança
demonstra; mães que não acompanham as atividades de seu filho e mães
que punem a criança pela seu fracasso nas atividades escolares.
Isso acontece pelo fato de os pais desconhecerem como ocorre a
aprendizagem e, portanto, necessitam de orientações específicas a esse
respeito. Sabe-se, também, que, muitas vezes, os conflitos familiares
estão associados a essas manifestações e que as relações familiares são
relevantes no desenvolvimento da criança, havendo, portanto, a
necessidade de maior compreensão desse processo, por parte dos
profissionais, para que possam intervir de forma mais abrangente diante
da problemática.
Em muitos casos, em um trabalho especializado com crianças apresentando
dificuldade de aprendizagem, não é suficiente transmitir aos pais as
atividades específicas a serem realizadas; outros aspectos ligados à
família, à escola ou relacionados a dificuldades em outras áreas do
desenvolvimento também estão presentes, e é necessário ouvir os pais,
analisar a situação e buscar caminhos que facilitem o desenvolvimento
global da criança.
Alguns pais confiam seus filhos com dificuldade de aprendizagem aos
professores acreditando que o mau desempenho da criança seja
proveniente apenas de si mesma, sem questionar sua possível
participação nessas alterações.
A importância da participação da família no processo de aprendizagem é
inegável e a necessidade de se esclarecer e instrumentalizar os pais
quanto as suas possibilidades em ajudar seus filhos com dificuldades de
aprendizagem é evidenciada ao manifestarem suas dúvidas, inseguranças e
falta de conhecimento em como fazê-lo. Conforme Martins (2001, p.28),
“essa problemática gera nos pais sentimentos de angústia e ansiedade
por se sentirem impossibilitados de lidar de maneira acertada com a
situação”.
Acredita-se que um programa de intervenção familiar seja de fundamental
importância para o desenvolvimento e aprendizagem da criança. O
relacionamento familiar, a disponibilidade e interesse dos pais na
orientação educacional de seus filhos, são aspectos indispensáveis de
ajuda à criança. Em um trabalho de orientação a pais, de acordo com
Polity (1998), é possível despertar a sensibilidade dos mesmos para a
importância destes aspectos, dando-lhes a oportunidade de falar sobre
seus sentimentos, expectativas, e esclarecendo-lhes quanto às
necessidades da criança e estratégias que facilitam o seu
desenvolvimento.
Através das experiências e relações interpessoais, a família pode
promover o desenvolvimento intelectual, emocional e social da criança.
Ela pode criar situações no dia-a-dia que estimularão esses aspectos,
desde que esteja desperta para isso. Além disso, a participação da
criança nas atividades rotineiras do lar e a formação de hábitos também
são importantes na aquisição dos requisitos básicos para a
aprendizagem, pois estimulam a organização interna e a habilidade para o
‘fazer’, de maneira geral (MARTURANO, 1998).
A família tem um papel central no desenvolvimento da criança, pois é
dentro dela que se realizam as aprendizagens básicas necessárias para o
desenvolvimento na sociedade, como a linguagem, sistema de valores,
controle da impulsividade. As características da criança também são
determinadas pelos grupos sociais que frequenta e pelas características
próprias, como temperamento.
As crianças possuem uma tendência natural, instintiva que as direciona
ao desenvolvimento de suas potencialidades. Os pais devem ter
conhecimento desse processo para que não dificultem ou impeçam o
crescimento espontâneo da criança. Pela falta de compreensão da
natureza e necessidades básicas do ser humano, os pais, muitas vezes,
prejudicam a busca do próprio desenvolvimento, pela criança. O modo
como os pais lidam com seus filhos pode ajudá-los no desenvolvimento
das suas potencialidades e no relacionamento com o mundo,
possibilitando-lhes o enriquecimento pessoal através das experiências
que o meio lhes proporciona.
O processo educativo (desenvolvimento gradativo da capacidade física,
intelectual e moral do ser humano) familiar deve ser adequado para
possibilitar à criança o sucesso na aprendizagem, proporcionando-lhe a
motivação, o interesse e a concentração necessária para a apreensão do
conhecimento.
A adequação desse processo compreende o atendimento às necessidades da
criança quanto à presença dos pais compartilhando suas experiências e
sentimentos, orientação firme quanto aos comportamentos adequados,
possibilidade de escolhas, certa autonomia nas suas ações, organização
da sua rotina, oportunidade constante de aprendizagem e respeito e
valorização como pessoa.
A criança necessita de equilíbrio entre condutas disciplinares e
diálogo, compreensão e carinho. Num processo educativo os pais
experienciam a necessidade de um trabalho de auto-análise, de
reestruturação de seus comportamentos, crenças, sentimentos e desejos.
Os pais precisam conquistar, em relação a si mesmos, primeiramente, o
que querem que os filhos sejam: justos, disciplinados, honestos,
responsáveis (GRUNSPUN, 1985). Esse processo ocorre nas vivências do
dia-a-dia, na medida em que pais e filhos comunicam-se de maneira
transparente e sincera, falando de suas percepções, suas dúvidas,
objetivos, emoções, aprendendo uns com os outros.
Criar filhos não significa torná-los perfeitos, pois os pais têm muitas
dúvidas e estão sujeitos a muitas falhas; mas o que é necessário é
tentar identificar os conflitos e desfazê-los, aprendendo a conviver
com essas situações. Através dos conflitos os pais desenvolvem a
percepção de si mesmos e de seus filhos. Essas situações estimulam pais
e filhos a instalar um diálogo verdadeiro, expondo o entendimento e
sentimento em relação às experiências cotidianas. Por outro lado,
aspectos fundamentais do processo educativo revelam que os pais devem
ter respeito sobre o que o filho sente, mas cabe a eles negar com
firmeza e determinação as atitudes que possam contrariar o que desejam
para a educação de seus filhos (TIBA, 1999).
Dificuldades escolares apresentadas pelas crianças, relacionadas à
falta de concentração e indisciplina ocorrem e podem ser causadas pela
ausência de limites. A primeira geração educou os filhos de maneira
patriarcal, isto é, os filhos eram obrigados a cumprir as determinações
que lhes eram impostas pelo pai. A geração seguinte contestou esse
sistema educacional e agiu de maneira oposta, através da
permissividade. Os jovens ficaram sem padrões de comportamentos e
limites, formando uma geração com mais liberdade do que
responsabilidade.
Tanto na família quanto na escola, segundo Tiba (1999, p.45), há “a
necessidade de orientação às crianças quanto às regras disciplinares,
para que elas possam desenvolver a capacidade de concentração e de
apreensão dos conceitos”. A aprendizagem se dá de maneira gradativa e
não será possível sem a participação ativa do aluno, de maneira
disciplinada, orientada.
Os pais devem preparar os filhos para arcarem com suas
responsabilidades. Na medida em que a criança vai aprendendo a cuidar
de si mesma, vai experimentando a sensação gratificante da capacidade
de enfrentar desafios. E cada realização é um aprendizado que servirá
de base para um novo aprendizado. Assim, realizando suas vontades e
necessidades, a criança vai gostando de si mesma, desenvolvendo a
auto-estima.
O relacionamento familiar também é fundamental no processo educativo. A
criança estará muito mais receptiva às instruções dos pais, se os
membros da família se respeitarem entre si, procurando conversar e
colaborar um com o outro. É importante a participação dos pais na vida
dos filhos, numa convivência como companheiros, compartilhando emoções,
o que contribui muito para a disciplina.
Todos esses aspectos citados e muitos outros, são fundamentais para que
o desenvolvimento da criança se efetive. Portanto, a família necessita
da ajuda dos profissionais na aquisição desses conhecimentos básicos e
essenciais para que possa cumprir seu papel de facilitadora do
processo de aprendizagem de seus filhos, através de comportamentos mais
adaptativos.
4 A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA NESTE CONTEXTO
A intervenção psicopedagógica veio introduzir uma contribuição mais
rica no enfoque pedagógico. O processo de aprendizagem da criança é
compreendido como um processo abrangente, implicando componentes de
vários eixos de estruturação: afetivos, cognitivos, motores, sociais,
políticos, etc. A causa do sucesso de aprendizagem, bem como de suas
dificuldades, deixa de ser localizada somente no aluno e no professor e
passa a ser vista como um processo maior com inúmeras variáveis que
precisam ser apreendidas com bastante cuidado pelo professor e
psicopedagogo.
Um outro problema grave a ser ressaltado é uma concepção redutora do
modelo piagetiano que tem sido adotada em boa parte dos cursos de
Pedagogia, no qual são privilegiadas apenas as colocações iniciais da
sua obra. Ela tem direcionado os professores a conceberem o processo de
ensino-aprendizagem de uma maneira estática, universalista e
atemporal. Com isto ficam de fora as contribuições mais importantes de
Piaget em relação aos processos de equilibração e reequilibração das
estruturas cognitivas (MARCELINO, 1998).
O educador já não se defronta com um processo linear de crescimento e
desenvolvimento, tanto no desenvolvimento intrínseco como na expressão,
mas com um realizar-se descontínuo no qual fases e períodos se
entrecruzam, se opõem dialeticamente, oposições de que resulta uma nova
estruturação. Paragens, acelerações, saltos bruscos são a expressão
formal. Isto altera completamente o panorama da pedagogia graduada: se o
desenvolvimento não é contínuo e ininterruptamente acelerado e
progressivo, como se lhe adequará uma educação regulada por grandes
períodos de desenvolvimento? Como pretender apreender a instabilidade do
desenvolvimento pela instabilidade de um processo educativo que se
mede por anos? Os fins da pedagogia não deveriam apontar para o homem
futuro, o que realmente será permanente e atuante, e não para as etapas
da idade evolutiva? (MARCELINO, 1998).
Esta visão aponta um deslocamento de uma vertente universalista atemporal para uma vertente particularista temporal.
Oliveira (1995) revela alguns dos aspectos fundamentais deste processo.
Segundo a autora, o fundamental “é perceber o aluno em toda a sua
singularidade, captá-lo em toda a sua especificidade em um programa
direcionado a atender as suas necessidades especiais”.
É a percepção desta singularidade que vai comandar o processo e não um
modelo universal de desenvolvimento. Isto porque o uso do modelo
universalista camufla normalmente uma concepção preestabelecida do
processo de desenvolvimento do sujeito. Na intervenção psicopedagógica
deve-se evitar as chamadas “profecias auto-realizadoras”, isto é,
prognósticos que o professor lança a respeito do processo de
desenvolvimento de seu aluno sem levar em consideração o seu
desempenho.
É preciso que o psicopedagogo também altere a sua forma de conceber o
processo de ensino-aprendizagem. Ele não é um processo linear e
contínuo que se encaminha numa única direção, mas, sim, multifacetado,
apresentando paradas, saltos, transformações bruscas, etc.
O processo de ensino-aprendizagem inclui também a não-aprendizagem, ou
seja, a não-aprendizagem não é uma exceção dentro do processo de
ensino-aprendizagem, mas se encontra estreitamente vinculada a ele. O
aluno pode se recusar a aprender em um determinado momento. O chamado
fracasso escolar não é um processo excepcional que ocorre no sentido
contrário ao processo de ensino-aprendizagem. Constitui, sim,
exatamente a outra face da mesma moeda, o seu lado inverso.
O saber e o não-saber estão estreitamente vinculados. O não-saber se
tece continuamente com o saber. Com isto, pretende-se dizer que o
processo de ensino-aprendizagem, do ponto de vista psicopedagógico,
apresenta sempre uma face dupla: de um lado, a aprendizagem, e do
outro, a não-aprendizagem.
O desejo de saber faz um par dialético com o desejo de não-saber. Segundo Fernández (1991, p.87):
O jogo do saber-não-saber, conhecer-desconhecer e suas diferentes
articulações, circulações e mobilidades, próprias de todo ser humano ou
seus particulares nós e travas presentes no sintoma, é o que nós
tratamos de decifrar no diagnóstico.
Neste contexto, a aprendizagem coloca em foco as diferentes dimensões
do aprendiz sob a ótica integradora dos aspectos cognitivo, afetivo,
orgânico e social. O “olhar” sobre estes aspectos, ao mesmo tempo que
relativiza a importância da escola na aprendizagem, coloca em foco a
importância de toda a reunião de fatores extra-classe que interferem no
processo de construção do conhecimento e do papel de aprendiz.
Ao considerar a aprendizagem como um processo articulado ao momento do
aprendiz, a sua história e as suas possibilidades sob o aspecto
cognitivo, afetivo e social, a Psicopedagogia, segundo Silva (1998,
p.59):
Rompe a ligação ensino-aprendizagem, porque, tanto o aprender como
processo quanto o processo de construção do conhecimento não têm
relação necessária com o ensinar e, finalmente, porque ambos os
processos antecedem e ultrapassam o ensinar.
Sob este ponto de vista passa a existir a necessidade de o
psicopedagogo investigar com profundidade os contextos do aprendiz e
tentar reuni-los em uma síntese que retrate o momento desse aprendiz,
ao mesmo tempo que viabiliza a aprendizagem.
Para aprender, o aluno precisa estar apto a fazer um investimento
pessoal no sentido de renovar-se com o conhecimento. Implica um
movimento que envolve, tanto a utilização dos recursos cognitivos
mesclados com os processos internos, quanto com suas possibilidades
sócio-afetivas. Vale dizer que a aprendizagem vai acontecendo à medida
que o educando vai construindo uma série de significados que são
resultados das interações que ele fez e continua fazendo em seu
contexto social.
Popularizou-se a visão de que não basta e nem é garantia de sucesso
escolar um ambiente doméstico favorável materialmente aos estudos, e
uma professora interessada e competente para que a aprendizagem
aconteça com sucesso. Desta forma, trabalha-se com a possibilidade do
modelo de aprendizagem não se caracterizar como algo de cunho somente
individual, mas também como um modelo desenvolvido em uma rede de
vínculos que se estabeleceu em família.
É a família que dará noções de poder, autoridade, hierarquia, funções
que têm diferentes níveis de poder e onde aprendem habilidades
diversas. Aprendem ainda a adaptar-se às diferentes circunstâncias, a
flexibilizar, a negociar. Enfim, desenvolverá o pertencimento da
criança ao seu núcleo familiar. À medida que a criança vive em família e
se submete aos seus rituais, processo e desenvolvimento, ela vai se
individualizando, diferenciando-se em seu sistema familiar. Quanto mais
as fronteiras entre os membros da família estiverem nítidas, mais
possibilidade de individualizar-se a criança terá. Se tiver irmãos, é a
oportunidade de experimentar relações com iguais.
É neste cenário que a criança constrói o seu modelo de aprendiz e a
forma como ela se relaciona com o conhecimento. Para a família do
aluno, a escola tem uma simbologia e um significado que estará presente
na forma de “ser aluno” e na sua forma de participação nas atividades
escolares. A maneira pela qual a criança se integra e se entrega ao seu
processo de aprender está diretamente relacionado à capacidade
desenvolvida em família de viver o coletivo compactuado.
Para a escola do aprendiz, a família é a matriz indispensável para que o
trabalho de construção do cidadão aconteça. Toda a riqueza do
desenvolvimento da criança se inicia na família e vai se fortificando à
medida em que esta vai estabelecendo sua rede relacional que, na
seqüência, acontece na escola e se expande para além dela. É em relação
com seus pares e em um contexto democrático que a criança consolida o
seu papel social de cidadã. Porém, de uma forma geral, a escola não vê
com bons olhos interferências pedagógicas suscitadas pela família que,
por sua vez, nem sempre aceita orientações psicopedagógicas de caráter
formativo da escola.
Nesse jogo de forças quem perde são os alunos e, conseqüentemente,
todos os envolvidos. O sucesso está na unidade e na coerência de
atitudes. Eis um desafio constante que, sem dúvida, merece ser
perseguido.
4.1 DIFICULDADES PARA A PSICOPEDAGOGIA
O trabalho psicopedagógico, mesmo no atendimento individual, encontra
dificuldades localizadas no desconhecimento do processo de aprendizagem
e na própria relação com o aprendiz.
Num trabalho na instituição escolar, o psicopedagogo, além dessas
dificuldades, encontra outros tipos de resistência, pois essa ação
exige mudanças no sentido de avaliar as propostas de ensino, a partir
do acompanhamento do processo de aprendizagem do aluno.
À tradicional aceitação do rendimento do estudante, sem análise do seu
processo de elaboração e das condições para sua aprendizagem, cria um
falso quadro sobre a situação de escolarização (MASINI, 1994).
Nesse enfoque, os maus resultados são vistos, quase exclusivamente,
como de responsabilidade do aprendiz. Apontá-lo como lento,
problemático, ou sem pré-requisitos é um procedimento comum por parte
das equipes educacionais, nas suas várias instâncias.
Analisar o processo do aluno em situação de sala de aula, na relação
com o professor e os colegas ante as condições de ensino que lhe são
oferecidas, constitui uma drástica mudança no quadro da escolarização,
exigindo dos educadores constante reflexão sobre sua ação. Isto não é
fácil, pois envolve transformações de atitudes e do pensar dos
educadores.
É preciso repensar o ato de aprender na instituição escolar utilizando
uma proposta viável em busca de uma aprendizagem significativa por
parte do sujeito.
5 CONCLUSÃO
Este trabalho possibilitou compreender que é de suma importância uma
relação cordial entre família e escola, ficando claro que ambas devem
caminhar juntas, pois torna-se necessário este entrosamento para que os
alunos tenham uma aprendizagem sequencial, na qual, os pais colaboram
diretamente com as propostas da escola. E a escola se propõe interagir
com a comunidade que a circunda, resultando, assim, num bom
desenvolvimento e crescimento para ambas.
De acordo com a literatura pesquisada, constatou-se também os efeitos
da rotulação e dos problemas de aprendizagem na escola, necessitando,
ainda mais a atuação do psicopedagogo dentro das instituições
escolares, trabalhando com diagnósticos, auxiliando os professores na
sala de aula e, principalmente, na prevenção dos casos de alunos com
problemas de aprendizagem, evitando mais um fracasso escolar.
Em síntese, uma escola é funcional quando conta com forte aliança entre
a comunidade, o corpo docente e o administrativo, os quais trabalham
os seus conflitos através da colaboração e diálogo. Esses elementos são
flexíveis em sua maneira de lidar com os conflitos, utilizando-se do
conhecimento de várias técnicas e métodos adequados. As decisões são
tomadas em conjunto e a participação dos alunos é solicitada, mas sem
ser igualitária. Cada membro do sistema escolar tem seu papel
determinado. O psicopedagogo observa e diagnostica o sistema escolar e,
então, cria condições favoráveis para a resolução dos problemas que
surgem, fazendo com que o ensinar e o aprender se tornem comprometidos.
Sendo assim, a atuação do psicopedagogo dentro da escola exige algumas
características básicas.
6 REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, 1996.
CECCON, Claudius; OLIVEIRA, Miguel Darcy de; OLIVEIRA, Rosiska Darcy de. A vida na escola e a escola da vida. 34 ed. Petrópolis: Vozes, 1999.
CHIZZOTTI, A. A pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez, 1991.
FERNÁNDEZ. A. A inteligência aprisionada: abordagem psicopedagógica clínica da criança e da família. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991.
GRUNSPUN, H. Autoridade dos pais e educação da liberdade. São Paulo: Almed, 1985.
KUPFER, Maria Cristina. Freud e a educação: o mestre do impossível. São Paulo: Scipione, 1989.
MARCELINO, Lourdes. Administração e supervisão escolar: questões para o novo milênio. São Paulo: Pioneira, 1998.
MARTINS, Nanci de Almeida Rezende. Análise de um trabalho de orientação a famílias de crianças com queixa de dificuldade escolar. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas, 2001.
MARTURANO, E. M. Ambiente familiar e aprendizagem escolar. In: C. A. Funayama (Org.). Problemas de aprendizagem: enfoque multidisciplinar. Ribeirão Preto: Legis Summa, 1998.
MARTURANO, E. M. Recursos no ambiente familiar e dificuldades de aprendizagem na escola. In: Psicologia: teoria e pesquisa, v. 15, n.2, p. 135-142, mai.ago./1999.
MASINI, Elcie F. Salzano (Org.). Psicopedagogia na escola: buscando condições para a aprendizagem significativa. São Paulo: Loyola, 1994.
OLIVEIRA, Marta Kohl. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. 2.ed. São Paulo: Scipione, 1995.
POLITY, E. Pensando as dificuldades de aprendizagem à luz das relações familiares. In: POLITY, E. Psicopedagogia: um enfoque sistêmico. São Paulo: Empório do livro, 1998.
RACY, Andréa; VIEIRA, Patrícia. As dificuldades de aprendizagem na escola. Disponível em: . Acesso em 24/03/2006.
ROGERS, C. O tratamento clínico da criança-problema. São Paulo: Martins Fontes, 1978.
SILVA, Maria Cecília Almeida. Psicopedagogia: em busca de uma fundamentação teórica. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.
TIBA, Içami. Disciplina na medida certa. São Paulo: Gente, 1999.
7 ANEXO
ENTREVISTA REALIZADA POR ANDRÉA RACY E PATRÍCIA VIEIRA PARA O SITE: .
ENTREVISTA: AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM NA ESCOLA
ENTREVISTADA: NEIDE DE AQUINO NOFFS
Andréa e Patrícia – Quais os instrumentos que você utiliza para identificar os alunos com dificuldades de aprendizagem?
Neide: Os instrumentos que utilizo são: observações, situações
pedagógicas, situações projetivas, entrevistas com professores e com
famílias dos alunos, questionários, análise da produção do
aluno/professor/hora do jogo.
Andréa e Patrícia – Como a escola procede no sentido de fazer
o encaminhamento de um aluno para realizar um diagnóstico ou um
trabalho psicopedagógico?
Neide: O encaminhamento é feito somente após o professor
esgotar seus recursos didático-pedagógicos em sala de aula,
diferenciando problemas educativos, de sociais.
Andréa e Patrícia – Quais os cuidados que a escola deve tomar em relação ao aluno, à família e aos professores responsáveis pelo aluno?
Neide: Os cuidados em relação aos responsáveis pelo aluno,
seja família ou professor, é trabalhar no sentido de prevenir problemas
de aprendizagem escolar através de grupos de estudo, grupos de apoio à
família, projetos específicos envolvendo a formação de qualidade do
professor e o entrosamento da família e escola.
Andréa e Patrícia – Qual o papel da escola diante dos alunos com dificuldades de aprendizagem?
Neide: O papel da escola é o acolhimento à diversidade,
criando condições não só de acesso, mas, o de permanência dos alunos na
instituição escolar. Criar situações mobilizadoras onde novas
ferramentas sejam veiculadas, aproximar-se das famílias respeitando as
diferenças, rever o conceito de conteúdo, trabalhar na integração de
pessoas, metas e conceitos. O papel do psicopedagogo na escola deverá
ser o de um profissional que assessore a equipe e comunidade no sentido
de apoio psicopedagógico, buscando identificar e enfrentar as
dificuldades detectadas. O município de Ourinhos-SP já implantou este
profissional na rede pública com esta meta.
Andréa e Patrícia – Você poderia sugerir bibliografia sobre o assunto que possa auxiliar o trabalho do psicopedagogo?
NOFFS, Neide A. O psicopedagogo na rede de ensino. São Paulo: Elevação, 2003.
COLOMER, Camps. Ensinar a ler ensinar a compreender. Porto Alegre: Artmed, 2002.
POZO, Juan Ignácio. A solução de problemas, aprender a resolver, resolver para aprender. Porto Alegre: Artmed, 1998.
URIES, Zan; HILDEBRANDT et al. O currículo construtivista na Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed, 2004.
SOLE, Isabel. Orientação educacional e intervenção psicopedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2001.
fonte: pedagogiaaopedaletra.com
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